Texto por Cussa Mitre
Quando falamos de demônios, Árvore da Morte ou Qlipoth, automaticamente parece que um alarme começa a soar em nossas cabeças, algo quase como se fosse um sentido aranha. Mas por que temos tanto medo encararmos nossa sombra?
De acordo com o Censo de 2010, 86,8% das pessoas se declaram sendo de alguma religião cristã, seja católica ou protestante. Logo, existe uma grande chance que você, leitor deste texto, tenha vindo de uma família que te criou com alguma base cristã. E aqui está uma das principais raízes do porquê o sentido aranha começar a soar quando você se depara com aquele livro na prateleira: conceitos de bem e mal.
Desde pequenos, recebemos diversas informações que nos dizem que uma coisa só pode ser boa ou má. Os meios termos são quase inexistentes, tudo sendo explicado em uma dualidade absoluta. Até mesmo os desenhos (talvez hoje em dia isso esteja mudando) apresentavam vilões “simplórios” – a única razão para ele ser o vilão era porque ele era mau. Talvez fosse pelos roteiros rasos que eram vendidos nas “altas trapalhadas”, onde não nos preocupávamos tanto com as mensagens transmitidas, mas quanto vilões vocês conseguem enumerar que não eram simplesmente maus, exceto os filmes que tinham um roteiro e uma ideia?
Isso de certa forma começa desde pequenos. Até desenhos “inocentes”, como Pokemon e Digimon, tinham personagens que apenas “gostavam” de fazer maldades. Essa era a sua essência. E por isso, desde pequenos, estamos impregnados desta dualidade. E é esta dualidade que diz que uma coisa que fala de “morte, sombra e demônios” não pode ser boa.
Talvez aqui valha apontar para a fato de que, durante a Idade Média, a Igreja fazia um controle de informação através do (des)conhecimento da população. As missas era rezadas em latim, que não era a língua do povo. Logo, a Igreja detinha controle sobre o que era “verdade” e o que era “mentira”, o que era “bom” e o que era “mau.” Mesmo que não estejamos mais na Idade Média, muito dos conceitos foram perpetuados até os dias de hoje.
Mas é interessante notar que um dos tratados sobre demônios mais conhecido seja atribuído a ninguém mais ninguém menos que Salomão. Sim, o Salomão da Bíblia, filho de Davi, autor dos Salmos e dos Cânticos dos Cânticos. O homem que criou o templo para a Arca da Aliança.
Então por que ainda temos esse medo?
Essa dualidade impregnada em nós desde pequenos faz com que acreditemos que no escuro habitam seres perversos, que irão nos pegar se não nos comportarmos. É a velha máxima do Bicho Papão que vai pegar a criança que não comer tudo, não fizer o dever de casa ou não se comportar. E esse Bicho Papão é a representação do que comumente chamanos de demônios. Logo, desde muito cedo desenvolvemos o medo do escuro. E na maior parte das pessoas, esse medo nunca irá desaparecer.
E aqui talvez more o cerne do problema: no escuro, nossos sentidos são tolhidos. O nosso principal sentido, a visão, deixa de funcionar, e todos os outros em que não prestamos tanta atenção são “amplificados”. Nosso cérebro é bombardeado com tantas imagens e cores que no momento que isso é desligado, ele entra em choque: não há mais informações para processar. Se não podemos ver, não sabemos o que há lá. E justamente por não sabemos, não temos como avaliar o que se esconde nas sombras. E aí nossa mente vai buscar nos recôncavos de nossa infância os medos que temos. Haveria uma chance de que algo bom estivesse ali, mas o nosso medo faz com que tenhamos certeza de que se há algo ali, ele é do “mal”. Por isso muitos têm tanto problema para meditar: é você tentar silenciar tudo a sua volta e escutar a si próprio.
Ao se virar para caminhos que trabalham com o lado escuro, estamos aceitando que há coisas que não entendemos. Há coisas que tentamos esconder de nós mesmos, nos quartos mais sombrios do subconsciente. Trabalhar com o lado escuro é nada mais nada menos do que aceitar que somos humanos, que temos falhas, e que se tornar um ser “perfeito” é uma tarefa totalmente complexa, que leva a maior parte das pessoas apenas ao estado de decepção. Logo, por que não aceitar seus erros, defeitos e problemas, e viver melhor?
E aí você descobre o segredo mais interessante: todos os demônios estão dentro de nós, e são apenas reflexo de nossos medos, vontades suprimidas e desejos inalcançáveis. Conversar com demônios é aceitar todas as suas falhas, seus medos, entender o porquê de cada um deles. Para finalizar, deixo um comentário que ouvi de um amigo durante um ritual em uma ordem: “A maior batalha que você vai lutar é dentro de você próprio, com os seus demônios.” Hoje percebo que não é uma batalha, é uma conversa entre professor e aluno. Não tenha medo deles, pois eles talvez sejam os melhores professores que você irá encontrar.
Se você quiser saber mais sobre o caminho obscuro do autoconhecimento, um ótimo ponto de partida é Qabalah, Qliphoth e Magia Goética, do Dr. Thomas Karlsson.
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Cussa Mitre é arquiteto de sistemas, game designer, estudante de ocultismo, amante de cultura nórdica e runas, músico, fotógrafo. Seus trabalhos podem ser encontrados no site da Hod Studio e seu Instagram. Você também pode conversar com ele direto pelo Telegram.