Texto por Isabella Giordano
Magia é uma arte cuidadosa, uma arte onde dirigimos uma atenção total à criação. Quanto maior a energia dedicada à criação, mais poderosa ela pode se tornar. Levando em conta o conteúdo do livro Mágicka Visual, ele foi composto sob uma perspectiva mágicka; logo, nada dele foi posto sem propósito ou sem planejamento. Produzir um livro, como produzir qualquer obra mágicka, deve ser um ato poético.
Um bom livro nunca será apenas algo que carrega um conteúdo a ser absorvido. Quando entramos em contato com um bom livro, cria-se uma relação íntima e de troca com o objeto em si. O cuidado com cada letra que compõe a página é necessário para que transformemos um livro em uma entidade, e que ela possa se abrir e construir algo sólido com o leitor.
O projeto gráfico de Mágicka Visual foi feito pensado em um objeto altamente comunicativo, que permite que o leitor se sinta confortável e envolvido no processo de leitura. A navegação por ele é fácil e intuitiva, o título do capítulo no cabeço de cada página permite que o leitor possa se situar naquele espaço, mesmo que abra o livro aleatoriamente em qualquer página. Uma das diferenças do projeto original é o destaque dos exercícios em blocos cinza. Isso permite que o leitor não se perca nas consultas rápidas realizadas entre as leituras e as práticas.
Seguindo a metáfora da semente de Fries, diagramação do livro foi composta a partir de uma técnica musical: o texto segue uma batida. Logo, todos os espaços e medidas foram dispostos a partir do número 7. Da entrelinha, ao espaço entre os parágrafos, ao tamanho dos subtítulos, tudo foi costurado e interligado a partir dos múltiplos deste número. Como um blues, o texto possui síncopes, mas sempre é puxado de volta à sua batida rítmica. Essa é uma técnica muito interessante proposta por Bringhurst*, mas difícil de ser reproduzida num mercado editorial que funciona num ritmo industrial.
* Bringhurst, Robert. Elementos do estilo tipográfico. 3ª ed. São Paulo, Cosac Naify, 2015.
Um bloco preto do tamanho da mancha de texto abre cada capítulo, impondo ainda aqui uma conexão com a próxima página. Como as águas do rio que batem nas rochas, a leveza da fonte de texto contrasta com a solidez da abertura do capítulo (a Bebas Neue possui linhas firmes e impactantes). O sumário foi construído com essas mesmas rochas, a fonte e as linhas constituem um espaço duro como um muro que o leitor é convidado a ultrapassar e voltar a cada consulta do mapa. A fonte de texto é a LeMonde Livre, projetada pelo designer Jean François Porchez em 1998. Baseada na original LeMonde Journal (feita para o jornal LeMonde), a Livre é uma composição feita especialmente para livros, funcionando elegantemente nas dimensões que esse objeto demanda.
Para além de tudo isso, o leitor tem em mãos um livro ilustrado com desenhos do próprio autor. Em contraposição com o texto, as ilustrações “transbordam” pelas páginas. A moldura é um elemento visual extremamente poderoso, em geral ela cria uma sensação de distanciamento entre a imagem e o leitor, enquanto sua ausência o convida a entrar na imagem. A função de um livro ilustrado não é apenas ser lido, e sim que se penetre cada vez mais fundo em seu significado. Dessa forma, as ilustrações não são meramente decorativas, mas constroem um processo de significação junto com as palavras. Todo livro ilustrado transgride a forma convencional de decodificação do texto.
A confecção de um livro de qualidade, um livro de luxo, para usar o termo popular, está longe de ser apenas imprimir um texto em um papel amarelinho e uma capa dura. Um livro de luxo é um livro pensado, trabalhado, magickado. Todas as linhas e todos os espaços transpiram o conteúdo que eles devem expor. Aqui procuramos expor alguns detalhes da produção do Mágicka Visual. Mas tratamos apenas da diagramação, foi apenas uma das sementes. O que o leitor tem em mãos, é a árvore.
Isabella Giordano é diagramadora e trabalha com design editoral. E-mail: giordano.bella@gmail.com.