Frater Optimus, o mago das antigas, costuma usar o espaço dessa coluna para expor os absurdos que existem no meio do ocultismo – que talvez você não perceba, mas os cabelos brancos dele não deixam escapar.
Saindo um pouco do seu tema, mas mantendo o mau humor que lhe é peculiar, Frater Optimus hoje fala sobre como as pessoas caem até hoje em promoções mentirosas de Black Friday!
Era só o que me faltava. Brasileiro é mesmo um povo desgraçado. Reclama do Halloween, dizendo que é uma festa estrangeira e que não tem lugar na nossa cultura. Chega até mesmo ao ponto de inventar uma porcaria de um Dia do Saci para substituir essa data e reforçar uma ideia de ultranacionalismo. Tudo bem, eu não vejo problema nenhum em valorizar a cultura nacional. Mas eu espero um pouco de coerência. E parece que o brasileiro não tem nenhuma. Por exemplo, se o Halloween é uma festa estrangeira e não deve ser comemorada aqui, por que diabos todo mundo fica tão eriçado com essa porcaria de Black Friday? Nesse tipo de comemoração estrangeira ninguém vê problema, não é mesmo? Que coisa mais ridícula…
Eu não vou nem entrar no mérito do Natal e nas outras festas católicas, porque, mal ou bem, o Brasil sempre teve uma inclinação ao cristianismo. Eu não gosto disso, mas é um fato. Mas… Black Friday? As pessoas aqui nem sabem o que é isso. Mas se tem desconto, tudo bem, está tudo liberado. Afinal, uma das únicas leis que realmente pegaram no Brasil é a Lei de Gérson, que diz que “o importante é levar vantagem em tudo”. Não importa que a Black Friday seja coisa de americano, e esteja vinculada ao tal do Dia de Ação de Graças, que não significa absolutamente nada para quem não é americano. Não interessa se a coerência está indo para o bueiro. Descontos? Estamos aceitando!
Vou mudar um pouco de assunto, mas tudo vai fazer sentido daqui a pouco. Continue comigo.
Você sabe como funciona o famoso Golpe ou Conto do Vigário? A estrutura básica é a seguinte: o vigarista, fingindo ser uma pessoa inocente, ou até ingênua, revela para a vítima uma possibilidade de os dois se darem bem juntos – normalmente ganhando um dinheiro fácil. Mas para a vítima (que ainda não sabe que é vítima!) possa entrar no esquema, ela precisa dar uma demonstração de que está realmente comprometida (como por exemplo pagar um “sinal”, ou pagar uma taxa inventada), e tem pouco tempo para decidir. É nesse momento que a vítima toma uma decisão sem pensar direito, o vigarista se aproveita e desaparece. Existem diversas modalidades, e as histórias que se conta para enganar alguém são inúmeras. As principais lições que aprendemos do conto do vigário são:
- Desconfie de estranhos que apareçam com oportunidades boas demais para serem verdade;
- Se você não estiver interessado em levar vantagem em cima do outro, é impossível que você caia no conto do vigário;
- Pare para pensar, mesmo que o tempo seja curto – decisões precipitadas podem fazer você se arrepender.
Agora, voltemos ao tema Black Friday.
A Black Friday nos Estados Unidos tem descontos realmente bons. É na Black Friday que de fato começa a temporada de vendas natalinas naquele país, e é interessante para as lojas darem uma limpeza nos estoques. E nada melhor para limpar os estoques do que oferecer preços baixos por um tempo limitado. Mas aqui é diferente. Desde 2010 esse negócio acontece no Brasil, e esse povo desgraçado não aprende.
Aqui, o Natal já começou muito tempo atrás. Quando você encontrar o primeiro panetone na prateleira do supermercado, saiba que o Natal já chegou para o comércio. E isso, de uns anos para cá, vem acontecendo bem antes do novembro. A intenção do comércio não é limpar os estoques: é ganhar rios de dinheiro em cima de pessoas que querem levar vantagem.
O que acontece na Black Friday tupiniquim é uma versão em grande escala do golpe do vigário, porém sem interação pessoal, com vigaristas corporativos e milhões de vítimas querendo se dar bem. Como isso acontece?
Oportunidades boas demais
As lojas apresentam promoções falsas. Já ficou famoso o bordão “tudo pela metade do dobro”, e não é mentira nem exagero. É comum as lojas aumentarem os preços dos produtos dias antes da Black Friday para parecer que o desconto é maior – o produto que vale R$100 passa a custar R$180, para depois aparecer na Black Friday com 50% de desconto – isto é, custando “apenas” R$90, mais um frete de R$10. Ou seja: não existe promoção nenhuma.
Lei de Gérson
O comércio já sabe que o cidadão passou semanas, ou até meses, esperando a Black Friday chegar para poder gastar dinheiro e achar que fez bons negócios. Então, considerando que já existe uma predisposição a levar vantagem, fazendo compras na Black Friday, as compras provavelmente serão feitas de qualquer maneira, mesmo que as promoções não sejam realmente boas.
Decisão apressada
As lojas também fazem pressão para você comprar rápido – os estoques são limitados, a promoção tem dia para acabar, não dá tempo de pesquisar, se você não comprar agora só vai conseguir essas condições novamente no ano que vem. Então você, que passou semanas se preparando para esse momento, já está com o décimo terceiro na mão e encontrou promoções únicas e inacreditáveis, mas precisa comprar agora para não perder as oportunidades, vai comprar agora, sem nem pensar duas vezes.
Esse é o golpe do vigário da Black Friday brasileira. Eu já me conformei que os princípios e a coerência do brasileiro já foram parar lá onde Judas perdeu as botas. Já me conformei. Então meu conselho para você é simples. Faça suas compras na Black Friday. Mas evite o conto do vigário. Veja se os descontos são de verdade. Veja se a loja não está só te enganando. Aproveite as promoções, mas não tente se dar bem a todo custo. Porque é nesse momento que o vigarista dá o bote. Quem sai perdendo é o seu bolso. E não está fácil pra ninguém.