Ao falar dos mistérios da bruxaria, é quase inevitável lembrar do Sabá (que nós já explicamos em um outro texto). O que nem todo mundo sabe é que o famoso Sabá tem muito em comum com um outro acontecimento, não tão conhecido: A Caçada Selvagem. A Caçada, na verdade, é até mesmo anterior ao Sabá, mas acabou perdendo popularidade depois da exposição que o Sabá conquistou nos julgamentos de bruxas durante a Inquisição.
É A Caçada Selvagem Passando Na Sua Rua
Assim como o Sabá, a Caçada Selvagem pode ser classificada tanto como um evento que simplesmente ocorre quanto como um rito misterioso do qual se possa participar.
A Caçada Selvagem faz parte do folclore de várias partes do mundo – predominantemente dos países europeus. Em cada lugar, este mistério recebe um certo tempero local. Mas os elementos centrais são sempre os mesmos.
O nome da Caçada Selvagem representa bem a ideia que os populares têm deste acontecimento: um grupo de caçadores no exercício de sua função. É claro que estes caçadores sempre vêm em bandos, e nunca em silêncio. É claro, também, que seu caminho nunca é deixado intocado. A passagem da Caçada afeta o ambiente, e é uma visão impressionante (e muitas vezes aterrorizante) para aqueles que a testemunham.
Os Participantes da Caçada Selvagem
Se a Caçada Selvagem fosse apenas um grupo de caçadores comuns caçando por aí, não haveria nada de muito aterrorizante. O problema é que os caçadores não são nada comuns.
Todos os participantes da Caçada têm algo de fantasmagórico ou sobrenatural. Dependendo da cultura onde se encontram, os caçadores podem ser elfos, fadas, ou mesmo os espíritos dos mortos. São sempre encabeçados por um líder poderoso: um deus ou deusa (normalmente uma variação de Odin, Holda ou Hécate), figuras bíblicas (como o Diabo), ou mesmo personagens míticos (por exemplo, o Rei Artur).
E como em qualquer boa caçada, seus participantes não se limitam a figuras humanoides. Vários relatos incluem a participação de cavalos e cães, por exemplo. O ferramental básico da caça também é constantemente incluso nos relatos: armas, carroças e cornetas são recorrentes.
Testemunhando a Caçada Selvagem
Como qualquer evento mágico, a percepção da Caçada Selvagem varia de acordo com o observador.
O nível de credulidade ou receptividade das testemunhas também impacta na forma como elas enxergam a Caçada. Os menos crédulos podem considerar tratar-se apenas de fenômenos naturais, como nuvens com formatos muito peculiares no céu, sons de ventania, de tempestade, folhas sopradas pelo ar. Por outro lado, há muitas pessoas que relatam os mínimos e incríveis detalhes da passagem da Caçada.
Curiosamente, o nível de detalhamento parece variar bastante de acordo com a região. Nos países nórdicos, por exemplo, a Caçada raramente é vista, mas é frequentemente ouvida. Já na Inglaterra, os relatos costumam ser mais minuciosos, incluindo descrições visuais dos participantes (que são normalmente em torno de vinte a trinta).
O Destino das Testemunhas
Ver ou ouvir a Caçada Selvagem passando à sua frente, seja qual for o nível de detalhes percebido, não é algo a se ignorar. Presenciar este acontecimento pode significar boa ou má sorte. Mas nunca é um acontecimento neutro ou desprezível.
Via de regra, diz-se que opor ou atrapalhar os caçadores resulta em má sorte, desastres, ou até mesmo a morte. Por outro lado, colaborar com eles, como por exemplo ao oferecer comida e bebida, pode trazer recompensas materiais, como dinheiro. Relatos de testemunhas que recebem um objeto amaldiçoado das mãos dos caçadores também não são raros.
Se você não vai à Caçada, a Caçada vai até você
A principal diferença entre o Sabá das Bruxas e a Caçada Selvagem é apontada por Peter Grey, em Bruxaria Apocalíptica:
O que difere entre a caçada e o Sabá é que a caçada se move pelo espaço social, enquanto o Sabá é uma comunhão celebrada fora dele. A caçada selvagem pode ser vista, pois é uma incursão dos mortos no mundo dos vivos. O Sabá, em clara distinção, deve ter participação, devemos voar até ele, ele não passará pela nossa porta. A caçada um é banquete ambulante, enquanto o Sabá é um lugar designado, na montanha da Senhora.
Peter Grey – Bruxaria Apocalíptica, p. 165
Quem presencia a passagem da Caçada Selvagem não precisa só observar. Dizem as lendas que quando a Caçada Selvagem passa por alguém que está dormindo, essa pessoa pode (de propósito ou não) se juntar à Caçada.
Participar da Caçada Selvagem não é um privilégio apenas dos que dormem, ou daqueles que participam dela por acaso. A Caçada é uma iniciação àquilo que é Selvagem. É uma forma de celebrar e de nos reconectarmos com aquilo que deixamos de ser. A Caçada Selvagem é um dos ritos centrais da Bruxaria, que podemos celebrar até hoje, mesmo que caçadores não passem montados a cavalo tocando suas cornetas nas janelas de nossos apartamentos.
Bruxaria Apocalíptica, de Peter Grey, apresenta estas tradições ancestrais em suas formas históricas e nos mostra como elas podem e devem ser celebradas em nosso cenário atual. Além da Caçada Selvagem e do Sabá, o livro trata de licantropia, do Diabo e dos mistérios lunares, entre outros temas igualmente relevantes.
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