Para nosso colunista, Frater Optimus, nada nunca está bom. Na época dele tudo era melhor. Ele é um mago das antigas, mas mesmo não estando certo o tempo todo, ouvir o que ele tem a dizer ajuda a perceber alguns dos absurdos dos dias de hoje.
Neste texto, Frater Optimus fala sobre os modernos praticantes do neopaganismo – que ele convencionou chamar, carinhosamente, de “abraçadores de árvores”.
Era só o que me faltava. Fui na livraria um dia desses e aproveitei para dar uma olhada nos livros de magia. Nem sei por que eu perco tempo com isso. Faz tempo que não lançam nada que preste por aqui. Mas fui lá mesmo assim.
Tinha uma prateleira com uma plaquinha escrito “Bruxaria”. Interessante, pensei. Mas aí fui olhar os livros que estavam nessa prateleira.
Que decepção.
Não tinha nada sério por lá. Nada. Tinha um tal de Almanaque das Bruxas, ou coisa parecida. Vê se pode uma coisa dessas! Tinha outro livro que só explicava que as bruxas não precisam ser más. Um monte de livros ensinando a usar plantas da Europa que nunca existiram abaixo do Equador. Tinha até uma porcaria de um livro de receitas! Mas a gota d’água foi um tal Livro da Wicca Cristã!
Veja bem, eu não tenho nada contra as bruxas, nem contra os bruxos. Respeito bastante, na verdade. Tive até uma namorada bruxa quando era mais novo, era uma coisa da família dela. Essas sérias eu respeito. Mas esse bando de jovens que vestem roupinha preta, abraçam árvore, comemoram rodinha do ano, e parou por aí… Aí não tem condição. Não tenho como levar a sério.
Qual é o propósito de comemorar roda do ano e abraçar árvore? Conectar com a natureza? Que natureza? O único bicho que essa gente já viu é gatinho e cachorrinho de apartamento. Não sabem o nome da árvore que tem na calçada de casa. Aí me vem com esse papo de conectar com a natureza? Isso pra mim é religião. É a mesma coisa que ir na igreja, comemorar natal, páscoa, essas porcarias. Não muda nada. Cadê a magia? Cadê?
Plantinhas da Europa. Acônito, amanita muscaria (tá, eu sei que não é planta!), mandrágora… Nada disso tem aqui! Mas as bruxinhas (e os bruxinhos) moderninhos só sabem imitar. Legal é o que tem na Europa, nos Estados Unidos. Se essa gente tivesse noção do quanto a Ayahuasca, a Jurema e o Rapé, por exemplo, são incríveis… E tem mais: nossos vizinhos latinos têm alternativas interessantes: Tocha de São Pedro, Psylocibe… Me diz: pra que ficar imitando europeu com tanta coisa boa no nosso quintal? Não sei se é burrice, medo ou preguiça. Juro que não consigo entender.
Livros de receita. Aí é que eu não consigo entender mesmo. Por que diabos a bruxa tem que se alimentar diferente do resto das pessoas? E pior ainda: tem um monte de bruxas por aí que vem com esse papo de que é importante ser vegetariano, vegano, sei lá como se diz. Porque fazem muita crueldade com os animais, e não querem incentivar isso. Mas vem cá: arrancar uma parte de uma planta e deixar ela viva e agonizando é aceitável? Quando você come uma alface, não está matando uma criatura viva do mesmo jeito? E se a ideia é reconectar com a natureza… você acha, realmente, que dá pra ser vegetariano na natureza? É claro que não! Cadeia alimentar, matar e morrer por comida – isso é natureza. Se você não quer participar disso, não me venha com esse papinho de querer contato com a natureza. Porque você não quer.
Outra que eu não consigo engolir é esse pessoalzinho que diz que celebra o sagrado feminino, as fases da mulher e da lua, mas que não aguenta uma porcaria de uma cólica, e toma remédio pra segurar o excesso da TPM. Quer celebrar sagrado feminino? Mergulha de cabeça. Só não venha me encher o saco com esse papinho se você não abraça de verdade esse mistério.
Mas o fim da picada, de verdade, é esse negócio de bruxa ter que ser boazinha. Eu acho que aquele menino, o Gerald Gardner, jogou uma pá de cal quando inventou a tal da Wicca. Esse negócio de bruxaria boazinha não está com nada. Nasceu pra dar errado. Bruxaria nunca foi boazinha. Bruxaria é benandanti e curandeira, mas também é venefica e malefica. Não existe esse negócio de bruxinha boa. Se se diz boa, não é bruxa. É uma imbecil que ou está enganada ou está enganando. Não existe esse negócio de pessoa boa, na verdade. Todo mundo é bom numa hora, mau em outra hora, e algo no meio do caminho a maior parte do tempo. Querer ser bonzinho o tempo todo pra mim tem outro nome: cristianismo. Isso é medo de punição. Lei tríplice, pra mim, é a mesma coisa que ter medo do Inferno, com direito a capeta, tridente e lago de fogo. Bando de imbecis…
É isso. Estou de saco cheio dessa gente que é metida a bruxa ou bruxo, mas que não faz por onde. Pra mim é tudo um bando de adolescentes abraçadores de árvores sem noção que só querem, na verdade, viver um conto de fadas e horrorizar o papai e a mamãe usando roupa preta e lápis de olho. Meu recado para vocês: cresçam e apareçam. E não me encham o saco.
Nós da Penumbra Livros não concordamos 100% com o Frater Optimus, mas achamos que ele tem razão em certos pontos. E é por isso que estamos lançando livros de bruxaria que fogem do padrãozinho martelado nas nossas cabeças há tanto tempo.
Bruxaria Apocalíptica, de Peter Grey, é considerado o livro moderno mais importante sobre bruxaria. Ele mostra um caminho para se conectar de verdade com os mistérios da bruxaria e da natureza, no ambiente moderno e urbano em que vivemos, e sem precisar abandonar práticas e crenças estabelecidas.
A Arte dos Indomados, de Nicholaj de Mattos Frisvold, fala sobre a Bruxaria Tradicional (nada a ver com Wicca) e aborda os principais temas dessa Arte de uma perspectiva roots, fugindo do falso moralismo, saindo do foco exclusivamente europeu, e sem medo de sujar as mãos.
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