A ideia aqui não é ser nostálgico, mas houve um tempo em que os impostos no Brasil eram mais baixos. Pagava-se o dízimo à Igreja – apesar de não ser um imposto propriamente dito, era meio esquisito não pagar o dízimo se você vivesse no Brasil no século XVIII. E pagava-se o Quinto ao Governo. Somando os dois (10% do Dízimo e 20% do Quinto), chegamos a 30%. Muito menos do que pagamos hoje. E o pessoal ainda tinha a pachorra de reclamar. E espernear. E burlar. E assim surgiram os santos do pau oco.
Os santos de pau oco eram exatamente isso: imagens de madeira, ocos por dentro, que eram recheadas de ouro em pó. Os mineradores não precisavam pagar impostos sobre ouro que “não existe”, somente sobre o que os fiscais podiam ver. E esses fiscais não ousavam quebrar as estátuas sagradas. Por isso não se pagava imposto sobre o ouro que ia dentro do santo. É o brasileiro fazendo brasileirices desde sempre.
A estratégia dos santos de pau oco é usada até os dias de hoje. Veja, por exemplo, o registro histórico e verídico mostrado nas telas no Episódio 19 da 1ª Temporada de Lost. Materiais menos nobres do que ouro também já rechearam estátuas de santos, como ilustrado pela imagem ao lado.
Santos Discordianos vs. Santos Católicos
Apesar da Igreja Católica fazer altas exigências para transformar alguém em santo, é claro que várias pessoas por aí que são consideradas santas são, na verdade, santos do pau oco. A fé cristã é tão restritiva que é virtualmente impossível viver uma vida sem “pecados”. E além da fraqueza da carne humana, os critérios de canonização são altamente questionáveis. O Papa João Paulo II ainda não virou santo. O Padre Cícero (Vulgo Padim Ciço) provavelmente nunca virará. Mas, ao mesmo tempo, até mesmo um cachorro alcançou o status de santidade de acordo com a Igreja. É o caso, por exemplo, de S. Guinefort. (Não, isso não é brincadeira.)
Os critérios para aceitação como Santo Discordiano são bem diferentes. E bem mais legais. Por exemplo, o santo não precisa estar morto. Na verdade, não precisa nem ter existido de verdade. Vamos dar uma olhada nos tipos de santos.
Classificação dos Santos Discordianos
Que fique desde o princípio estabelecido que não existe consenso sobre as classificações de santos.
É uma Antiga Tradição Erisiana nunca concordar com os outros a respeito dos Santos.
Principia Discordia, p. 00060
Isso posto, voltemos ao que interessa. Há cinco classes de santos, mas estas podem ser divididas da seguinte forma:
Santos Reais
O nível mais baixo de santo está reservado aos humanos que foram tocados pela Deusa. É o caso do Imperador Norton I (S. Norton Primeiro), autoproclamado Imperador dos Estados Unidos e Protetor do México.
Santos Imaginários
Todas as demais categorias de santos estão reservadas a personagens imaginários, pois esses têm muito mais chances de serem mesmo santos, e não santos de pau oco, como os pecadores cristãos. (Olhando por essa perspectiva, faz bastante sentido canonizar um cachorro. Talvez os cristãos tenham acertado alguma coisa.)
Como exemplos de santo, o Principia Discordia cita:
Yossarian – personagem de Ardil-22 (Catch-22), um piloto militar paranoico, que finge ser louco para tentar conseguir dispensa do serviço. Mas essa tentativa de fugir da guerra é, aos olhos de seus superiores, sinal de perfeita sanidade. Um personagem interessante, e certamente tocado pela Deusa.
Dom Quixote – o maior caçador de dragões inexistentes da história. Instaurado no nosso imaginário como o maluco proverbial desde 1605. Sem dúvida um protegido da Deusa, e mais do que digno do título.
Bokonon – fundador de uma religião fictícia (o Bokononismo) dentro de um romance fictício (Cama de Gato, de Kurt Vonnegut). É similar em santidade ao próprio Dom Quixote, com a diferença que Quixote só tinha seu fiel escudeiro, enquanto Bokonon tinha uma penca de seguidores.
E há, claro, os cinco Pioneiros do Discordianismo: Hung Mung, Dr. Van Van Mojo, Sri Syadasti, Zarabaque e Malaclypse o Ancião (não confundir com Malaclypse o Jovem). Esses, além de fictícios (será?), estão em comunicação direta com a Deusa, e por isso carregam consigo um nível incalculável de santidade.
E há, é claro, Patamunzo Lingananda.
O Principia Discordia é a fonte primordial para conhecer mais sobre os Santos Discordianos – sua história, ensinamentos, dias festivos, etc. O Principia também é imprescindível se você quiser discutir a classificação desse ou daquele personagem (real ou inventado). E é leitura obrigatória caso você queira saber mais sobre a palavra de Patamunzo Lingananda. E a boa notícia: você já pode comprar seu Principia Discordia, em português, na loja da Penumbra Livros!