“O Mágico de Oz” é uma das mais populares histórias já escritas. Lançada em 1900, a obra do norte-americano L. Frank Baum se consolidou como um ícone da cultura de massa a partir de 1939, quando Hollywood filmou a saga de Dorothy e seus improváveis amigos.
Se você conhece a história mas nunca leu o livro, recomendo fortemente que o faça! Apesar de ter sido escrito para crianças, “O Mágico de Oz” é uma fonte abundante de significados e metáforas sobre mensagens implícitas que podem ser extraídas do livro.
Bom, em primeiro lugar é bom deixar claro que existem inúmeras interpretações e teorias sobre as motivações do autor em cada detalhe do enredo. Em alguns minutos pesquisando na internet você encontra toda sorte de especulações.
Há quem diga que o clássico é repleto de significados esotéricos, tendo em vista o interesse de Baum por teosofia. Também há quem acredite que o livro faz uma alegoria da situação política dos Estados Unidos àquela época. Depois que saiu o filme, encontraram pirâmides e outros símbolos dos Illuminati em tudo que é cena.
Para dar conta de todas essas teorias ocultas, eu precisaria escrever uma tese de mestrado. Mas como eu só quero entreter você por alguns minutos, escolhi contar sobre a possível relação do mito Aleister Crowley com “O Mágico de Oz”. Ok, antes de terminar prometo falar também sobre duas lendas urbanas do filme: o anão enforcado nas filmagens e a incrível sincronia com o álbum do Pink Floyd.
O “Oz” de Crowley
Você deve lembrar que, após serem levados por um ciclone, Dorothy e seu cãozinho Toto vão parar na terra de Oz. A pobre menina só quer voltar para a casa onde vive com os tios no Kansas. Uma bruxa explica que sua única chance de conseguir voltar é pedindo isso a “Oz, o Terrível”, o mago que impera sobre os quatro cantos daquele mundo.
De onde Baum tirou o nome “Oz” para criar seu temível feiticeiro? A explicação mais comum é despretensiosa: o autor teria derivado o nome da etiqueta de uma das gavetas de seu armário (tipo arquivo) que dizia “O – Z”.
Outra figura notável viu um encanto especial nessas duas letrinhas: Aleister Crowley. Você certamente já ouviu falar de Crowley por aqui. Ele é uma das principais personalidades da tradição ocultista e foi contemporâneo de Baum.
Seja lá qual for o significado que o autor do livro viu na palavra, aparentemente Aleister Crowley resolveu tomá-lo emprestado para intitular, em 1942, o “Liber Oz”, ou Livro 77, seu polêmico livro de uma só página.
É claro que também pode ser apenas uma coincidência. Quando o livro foi lançado, o filme sobre Oz já estava há dois anos no circuito, fazendo grande sucesso com suas cenas coloridas em technicolor, um grande avanço na época.
O livro enuncia algumas das leis de Crowley que falam sobre o direito do homem de cumprir suas vontades:
“Faze o que tu queres, há de ser tudo da Lei.” – AL I:40
“Tu não tens direito senão fazer a tua vontade. Faze aquilo, e nenhum outro dirá não.” – AL I:42-43
“Todo homem e toda mulher é uma estrela.” – AL I:03
Não existe Deus senão o homem.
O “Liber Oz” está incluído na íntegra no livro O Renascer da Magia, de Kenneth Grant, que você encontra em uma bela edição em capa dura e ilustrada aqui na Penumbra Livros.
Aliás, fugindo rapidamente do script, o “Liber Oz” é cantado por Raul Seixas na música “A Lei”, sabia?
Agora voltando, você pode estar se perguntando: o que o texto de Crowley teria a ver com a narrativa do mágico de Oz?
Se você conhece a história completa, sabe que o “grande e temível” Oz na verdade é um charlatão (desculpe o spoiler caso você não conheça o enredo!). Sim, ele era uma pessoa comum — na verdade, nem tanto, pois era um ilusionista de circo — que aproveitou o acaso de ter ido parar em Oz (como aconteceu com Dorothy) para impor o medo e respeito a toda a população e se tornar o grandioso e espetacular governante daquele lugar (ou universo paralelo?) que foi então batizado com seu nome. Em uma análise simples, ele fez suas vontades para se dar bem, sem se preocupar muito com os outros.
Há ainda outro ponto de confluência nos desejos dos personagens. As três frases abaixo, extraídas do “Liber Oz”, poderiam se referir aos desejos da trupe de Dorothy:
“O homem tem o direito de pensar o que quiser.”
“O homem tem o direito de amar como quiser.”
“O homem tem direito de matar os que queiram contrariar estes direitos.”
O Espantalho quer um cérebro, o Homem de Lata quer um coração e o Leão Covarde quer coragem. Você vê ligação com a narrativa de Baum?
Tudo isso é apenas uma possível interpretação, tendo em vista que Baum de fato parecia simpatizar com ideias ocultistas, tendo se tornado membro da Sociedade Teosófica. Mas essa aparente associação das obras também pode ser apenas uma grande viagem.
Independentemente de Crowley, o livro “O Mágico de Oz” estaria repleto de sinais esotéricos compartilhados pelos praticantes da teosofia, o campo que estuda as raízes comuns de todas as religiões com o objetivo de formar uma doutrina universal.
Alguns exemplos pontuais são a estrada de tijolos amarelos (“yellow brick road”), uma metáfora para o caminho da alma até a iluminação — conceito chamado de “Golden Path” no budismo — e os sapatos prateados de Dorothy (“silver shoes”, que aliás são vermelhos no filme), uma referência ao cordão de prata (“Silver Cord”) que faz a conexão da consciência com o corpo físico no gnosticismo. A história por si só já é recheada de magos, feiticeiras e criaturas mágicas.
Outro ponto interessante de notar é que os personagens principais — Dorothy, Espantalho, Homem de Lata e Leão Covarde — estão o tempo todo em busca de algo que, como vemos no desfecho, eles acabam encontrando dentro deles mesmos. Não seriam eles verdadeiros magos canalizando suas vontades?
Há quem insista na existência de uma via de mão dupla entre Crowley e uma “Hollywood satanista” criticada por grupos cristãos. Simbolismos ocultos no filme poderiam indicar esse namoro, portanto anterior à publicação do “Liber Oz”. A imagem mais compartilhada é o desenho de Lam feito por Crowley, com traços parecidos a uma das aparições tenebrosas de Oz no filme. Lam seria uma inteligência extraterrestre com quem Crowley esteve em contato astral em 1919. Confira:
Certa vez, ao ser questionado sobre suas motivações para escrever “O Mágico de Oz”, Baum teria afirmado que a narrativa surgiu como uma “inspiração divina”. Será? Ou quem sabe uma forma de manifestar aquilo em que acreditava de forma indireta? Se foi isso, Crowley deve ter captado o que estava oculto, o que não foi escrito ou filmado. E nada mais gentil que prestar uma homenagem no título de uma de suas obras.
Lendas urbanas do filme “O Mágico de Oz”
Agora que já tivemos um papo mais cabeça, vamos finalizar falando sobre um tema com um quê de zoeiro, mas que todo mundo gosta: lendas urbanas. Sim, a adaptação para o cinema de “O Mágico de Oz” é cheia delas!
Você já ouviu falar do anão que teria se suicidado durante as filmagens?
O set tinha vários atores anões, eles representavam os habitantes da terra de Oz. Pois bem, reza a lenda que um deles se enforcou durante as filmagens. Até aí, beleza, pessoas decidem se matar em várias profissões, acontece. A coisa toda é que a cena teria sido indiretamente captada e — pasmem — entrado no filme.
Tem gente que jura que vê o corpo de um anão pendurado em uma árvore, balançando pra lá e pra cá no plano de fundo enquanto Dorothy e seus amigos seguem sorridentes cantarolando pela estrada dos tijolos amarelos. Para quem ficar curioso, vale assistir a este vídeo aqui:
Outra lenda que perdura é a impressionante sincronia do filme com o álbum “The Dark Side of The Moon” (1973), da banda Pink Floyd. Isto você pode fazer em casa: experimente dar o play no filme ao mesmo tempo em que dá o play no álbum e prepare-se para ver a mágica acontecer.
Alguns trechos das letras das músicas caem como uma luva para cenas do filme. Eles parecem descrever o que acontece com os personagens. Sem contar o fluxo das músicas, com seus pontos altos e viradas, que às vezes parecem encaixar como a própria trilha sonora do filme. Esse “fenômeno” ganhou até um nome: “The Dark Side of The Rainbow”.
Pois é, para ficar ainda mais interessante a coincidência, o arco-íris é um elemento que aparece na capa do CD do Pink Floyd, na forma de um feixe de luz, e ao mesmo tempo na música que Dorothy canta no filme, “Somewhere over the rainbow”.
O álbum foi lançado 34 anos após o filme, então o Pink Floyd até teria tido oportunidade de fazer essa brincadeira bem-bolada e secreta (que só entrou para o rol das lendas urbanas em 1995, quando foi divulgada em um fórum de fãs na internet). Mas a verdade é que a banda sempre negou que a sincronia das obras tenha sido proposital, embora os próprios músicos já tenham brincado com a coincidência algumas vezes e até incluído referências a “O Mágico de Oz” na capa do álbum ao vivo Pulse, onde o “The Dark Side of The Moon” foi tocado na íntegra.
Ficou com vontade de reler “O Mágico de Oz” e assistir ao filme depois de tudo isso? Eu fiquei! Se você gostou do texto, compartilhe com seus amigos. E se tiver algo interessante para contar sobre o tema, vou gostar de ler seus comentários aqui embaixo.
Se você quer saber mais sobre os ensinamentos de Aleister Crowley, continue acompanhando a Penumbra! Em breve lançaremos o livro “Aleister Crowley & The Hidden God”, de Kenneth Grant. O autor foi discípulo de Crowley. De Grant, você já encontra em nossa loja a obra “O Renascer da Magia” para pronta-entrega! Acesse aqui.