Chegamos aqui na metade da nossa série sobre as cores da magia. Até agora, falamos da malfadada magia negra, da magia azul e da verde. Agora é a vez da também pouco compreendida Magia Amarela.
O amarelo é uma daquelas cores pouco intuitivas – o que será que faz a Magia Amarela? Ao contrário do conceito difundido pela Tropa Sinestro, a magia amarela não tem nada a ver com medo. Tem a ver com o poder solar, e com o conceito do ego.
Magia Amarela nas Árvores da Vida e do Conhecimento
Na Cabala, o Sol é representado por Tiphareth, na árvore da vida, e por Thagirion, na árvore do conhecimento. Ambos representam facetas do trabalho com o arquétipo solar, e visam o desenvolvimento do adepto.
Na árvore da vida, o Sol está ligado a figuras messiânicas como Jesus Cristo ou Hórus. Em tempos mais modernos, figuras análogas aparecem na cultura pop, como por exemplo o Super-Homem ou Aslam. Estas são representações do arquétipo solar – são redentores, que conduzem à salvação. Só Jesus salva, nós não nos salvamos. O Super-Homem salva, nós somos impotentes perante as ameaças. E convenhamos – esperar um salvador não é exatamente o que se espera de um magista, acostumado a tomar as rédeas de seu próprio destino.
O trabalho da magia amarela está mais ligado à obra de Thagirion, o antipolo de Tiphareth. O trabalho da iluminação desse “sol negro” é fazer com que o indivíduo alcance seu máximo potencial, através do desenvolvimento do ego. Em vez de figuras solares clássicas, aqui encontram-se imagens como as de Odin, Set. São divindades que espalham suas luzes sobre os reinos dos mortos. É em Thagirion, por exemplo, que o adepto se depara com seu Sagrado Anjo Guardião.
O Aeon de Hórus
O modelo da passagem do tempo através dos Aeons é discutível. Duas correntes de pensamento dificilmente entram em consenso a respeito da evolução destes períodos de tempo. De acordo com Aleister Crowley (que não era e não é o dono da verdade), estamos atualmente no Aeon de Hórus. Esse Aeon teria começado em 1904, com o recebimento do Livro da Lei.
Sendo Hórus uma divindade solar, espera-se que seu Aeon culmine com uma ampliação da consciência solar da Humanidade. A ideia de Crowley certamente não é a do aumento da consciência de um salvador, e sim de que cada homem e cada mulher é uma estrela, e deve brilhar por conta própria. A magia amarela é uma ferramenta importante para atingir este objetivo.
Os Trabalhos da Magia Amarela
Apenas aqueles que percebem que possuem uma personalidade, e não consistem de uma personalidade, são capazes de modifica-la.
Peter J. Carroll, em Liber Kaos
O primeiro passo para trabalhar com sucesso os aspectos do ego é saber que você é capaz de alterar aquilo que você “é” a seu bel-prazer.
Alterando o Ego
Obras clássicas de invocação são úteis para se trabalhar aspectos do ego que se deseja alterar. Mas há outras formas para se alterar a própria personalidade. As invocações de aspectos práticos que se deseja alterar podem ser feitas num nível mais cotidiano e menos ritualístico. Isto significa fingir um comportamento ou pensamento por dias, até se tornar natural. Outra forma de se conseguir esse efeito é através de encantamento retroativo. Correndo o risco de resumir demais, essa técnica consiste em recontar esquizofrenicamente sua história pessoal até a nova versão se tornar verdadeira.
Carisma e Autoconfiança
Outros aspectos do ego que podem ser melhorados com magia amarela são o carisma e a autoconfiança. O simples ato de fingir uma autoconfiança ou carisma que não se tem de verdade, por tempo suficiente, é suficiente para conseguir de fato aumentar estes aspectos. Surpreendentemente, não é preciso muito tempo para conseguir mudar essas características. E isso não depende de cerimonial – apenas de atitude. Falando em cerimonial, em operações de magia amarela, é recomendável que se deixe um pouco de lado a solenidade.
Assertividade e Dominação
Um último aspecto do ego que se pode trabalhar com a magia amarela é o da assertividade e dominação. Isso, na verdade, tem muito pouco a ver com magia. Mas tem muito a ver com o subconsciente. (Mas o que é magia se não o ato de fazer com que efeitos subconscientes se materializem?) Tornar-se uma pessoa mais dominadora depende apenas da imagem que os outros fazem de você. E você pode fazer pequenas coisas para alterar essa imagem. O jeito de se portar, de falar, de ocupar o espaço, de tratar os outros, de emitir opinião – tudo isso impacta diretamente na percepção que se imprime sobre os demais. Isso é particularmente notável quando se trata com desconhecidos. Porte-se de forma dominante, e será tratado como tal. Porte-se de forma submissa, e o resultado vai ser totalmente diferente.
Em obras de magia amarela, o truque é fingir até conseguir. Finja ser outra pessoa, e você será. A personalidade é flexível. Você não é nada em absoluto. Tudo é elástico, e você pode mudar quem você é hoje mesmo, se você quiser. Nada é verdadeiro, tudo é permitido. Só esteja preparado para a mudança.
O excelente Kabbalah Hermética, de Marcelo Del Debbio, apresenta com detalhes os simbolismos associados ao Sol, a Tiphareth e seus caminhos (assim como todos os outros planetas, Sephiroths e caminhos na árvore da vida). Liber Null e Psiconauta é o primeiro livro de Peter J. Carroll, autor que desenvolveu e difundiu o modelo de oito cores da magia. Este livro apresenta técnicas importante de invocação que podem ser usadas para a magia amarela, e contém uma visão de Aeons contrastante com o proposto por Crowley, bastante pertinente como parâmetro de comparação. O Renascer da Magia, de Kenneth Grant (último discípulo direto de Crowley) apresenta uma discussão mais detalhada da visão dos Aeons segundo Aleister Crowley. Todos estes livros estão disponíveis na loja da Penumbra Livros.
Veja também:
As Cores da Magia: Magia Negra
As Cores da Magia: Magia Verde
Deuses Entre Nós: Deuses Solares
Entrevista com Peter J. Carroll
O Legado de Kenneth Grant: Aossic e Crowley