Shub-Niggurath é uma das poucas entidades dos Mitos de Lovecraft que foi adorada abertamente por diversas culturas, dos antigos povos inomináveis anteriores à história conhecida de nosso planeta, até os Egípcios e Babilônios. É o conceito primordial por trás de Gaia e Ishtar, entre outras tantas.
A Morte
Adorar uma representação da fertilidade é bastante compreensível, principalmente considerando culturas com altos índices de mortalidade, e dependentes da lavoura. Mas a adoração da Morte é também comum, perdurando até os dias de hoje. A Morte é objeto de adoração de diversas culturas. Suas representações antropomórficas são normalmente mulheres (embora alguns cultos venerem formas masculinas). Em particular, Morte dos Perpétuos se manifesta como uma jovem mulher, sempre vestindo preto. Outras versões englobam da clássica figura portando uma foice até as Valquírias, que conduziam os guerreiros ao Valhalla.
A Vida
As entidades dos Mitos de Lovecraft são normalmente tão alheias à compreensão humana que não se associam em definitivo com nenhum gênero. Podemos, por exemplo, pensar em Cthulhu como masculino. Mas analisando friamente, não há nenhum atributo obviamente masculino vinculado a Ele. Shub-Niggurath é uma das raras exceções, e traz características femininas muito marcadas. Vinculada ao conceito de fertilidade, é descrita muitas vezes como A Cabra Negra Com Mil Crias. Nenhuma descrição clara é dada pelo próprio Lovecraft, mas quase todas as menções a esta entidade mencionam sua prole formidável.
Shub-Niggurath é a força vital que impulsionou os primeiros organismos unicelulares a emergirem do lodo primordial. É fácil assumir, ingenuamente, que toda esta fecundidade se origina exclusivamente de sua força vital. Na realidade, a criação da vida é um processo cíclico. Vida nasce da morte. Matéria orgânica em decomposição é necessária para tornar o solo fértil. Predadores matam outros animais para alimentar seus filhotes. Até mesmo os herbívoros (ou vegetarianos) se alimentam de plantas mortas. Pais morrem antes dos filhos. Qualquer ecossistema conta com um equilíbrio delicado. Sem Morte, não há vida.
Vida e Morte são somente antagônicas?
Ao contrário das outras comparações desta série de Religião Pop Comparada (links abaixo), não há uma equivalência direta entre Shub-Niggurath e Morte dos Perpétuos. Há, sim, uma relação de interdependência. Um conceito não existiria sem o outro. É curioso que não haja uma representação clara da Vida nas criações de Gaiman, e ainda mais curioso que não haja uma entidade evidentemente associada à Morte nos Mitos de Lovecraft. Mas o que é a Morte, senão o grande momento da Vida?
Aplicações mágicas dos Mitos de Lovecraft são abordadas em maior profundidade em O Renascer da Magia, de Kenneth Grant e Epoch, de Peter J. Carroll.
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Nyarlathotep vs. Desejo e Desespero
Ilustração: Lourdes Saraiva