Dr. John Dee, Astrólogo da Rainha Elizabeth I da Inglaterra, tinha uma ambição considerável: desejava se comunicar com Deus e com seus Anjos. Apesar dos limites impostos pela visão cristã do Século XVI, Dee estava convencido de que este feito não seria impossível – afinal, Enoque foi capaz se comunicar diretamente com Deus; e, de acordo com algumas fontes, tornou-se o Anjo Metatron. Portanto, era possível não somente se comunicar com entidades superiores, mas até mesmo tornar-se uma delas. Dee decidiu que, para realizar este feito, precisaria desvendar os segredos da língua secreta que Enoque usava em suas comunicações: o idioma Enoquiano.
Aparentemente, John Dee obteve sucesso em redescobrir esta misteriosa língua. Seu trabalho, em conjunto com Edward Kelley, foi registrado em volumosos diários, e hoje está compilado de forma palatável para o estudante moderno. O sistema Enoquiano é reconhecido pelos praticantes como um dos mais eficientes – e perigosos – que se pode experimentar. Se comunicar com entidades superiores em seu próprio idioma tem o potencial de atrair muita atenção – como você reagiria se um rato olhasse para você e pedisse, em Português, uma fatia de queijo?
Origem da língua
Há alguma controvérsia a respeito da verdadeira origem do Enoquiano. Teria de fato este idioma misterioso sido canalizado por Dee e Kelley a partir de inteligências superiores, ou teria sido um fruto sincero de sua criatividade? Há estudiosos que apontam algumas semelhanças estruturais com a língua Inglesa, nativa dos dois exploradores. Mas mesmo que o Enoquiano seja uma língua “inventada”, o mérito destes dois exploradores não pode ser ignorado. Afinal, é quase unânime que o sistema funciona.
Como línguas estranhas podem funcionar?
Línguas estranhas, inventadas ou não, trazem o benefício automático de fazer com que a mente do operador funcione em níveis não plenamente conscientes. Os estados alterados de consciência são fundamentais para o sucesso de operações mágicas, e as línguas estranhas ajudam neste aspecto. Nas últimas décadas, cientes deste mecanismo de funcionamento, praticantes de magia vêm usando línguas deliberadamente inventadas, como o Uraniano Barbárico. O objetivo é obter resultados práticos, e não emular linguagens divinas.
De forma inversa, línguas estranhas podem se manifestar como consequência do acesso de regiões pouco exploradas do subconsciente. Este tipo de manifestação não é exclusivo de práticas ocultas: é relativamente comum ver pessoas “falando em línguas” em cultos evangélicos, em momentos de arrebatamento. O próprio termo “Goetia” vem da palavra Grega para “uivar”, dos sons não-humanos que surgem em ritos desta natureza.
Em O Renascer da Magia, Kenneth Grant explora este tema em maior profundidade, e relaciona os conceitos e nomes bárbaros do culto de Crowley e entidades dos Mitos Lovecraftianos. Seriam estas inspirações oriundas das mesmas regiões pouco exploradas da mente, ou comunicações indiretas de inteligências superiores?