Nosso colunista, Frater Optimus, estuda ocultismo e magia há décadas, então deve saber muito bem do que está falando. Às vezes ele tem razão, mas a cada dia que passa o vovô vai ficando para trás.
No texto de hoje, Frater Optimus desmistifica o tal Caminho da Mão Esquerda.
Era só o que me faltava. Agora tudo quanto é metido a malvadinho por aí diz que é seguidor do “caminho da mão esquerda”. Putz grila. Tenho certeza que eles nem sabem do que estão falando.
Primeiro eu tenho que falar dos malvadinhos. Não consigo ficar quieto, eu não me controlo. Acho a coisa mais ridícula desse mundo essa gente que fica “tirando ondinha” de capeta, roupinha cheia de espetos, de pentagrama de cabeça pra baixo, com camisa dessas bandas horríveis que não dá pra ouvir nem pra ler o nome, achando que é malvadinho. É tudo balela! Duvido que tenham colhões de matar até mesmo uma galinha – seja no terreiro, seja na cozinha. Duvido que não se borrem todos quando as macumbinhas derem errado. Du. Vi. Do.
(Desculpe, eu precisei botar pra fora, meu médico diz que eu não posso guardar rancor, é ruim para o coração. Mas já passou.)
Agora, de volta ao assunto. Esses malvadinhos agora entraram nessa modinha de dizer que seguem o caminho da mão esquerda. O que eles acham que é isso? Ouvir esses rocks pauleira é caminho da mão esquerda? Seguir “árvore da morte” é caminho da mão esquerda? Ou será que é faça o que tu queres? Ou necromancia? Ou fazer Goetia?
Eu vou falar para vocês. Nada disso é caminho da mão esquerda. Nada. Disso.
Para definir com precisão o que é o caminho da mão esquerda, passo a palavra a quem entende de verdade do assunto:
… a expressão Caminho da Mão Esquerda é um termo técnico indicando o uso mágico de energias sexuais …
Kenneth Grant – Aleister Crowley e o Deus Oculto, p. 71
E é só isso. É uma divisão dos tantras hindus. Se o sacerdote sinalizasse com a mão esquerda, ia ter sexo no ritual. Mão direita, sem sexo. É isso, e nada mais.
Mas não. Esse pessoal tem que ficar enfiando significado novo em termos velhos. Velhos não: milenares. Francamente, eu não tenho paciência nenhuma para esse pessoal de hoje em dia.
Ok. Respira…
Tudo bem. Vamos esquecer a definição histórica e vamos olhar o que os malvadinhos andam aprontando.
Necromancia é “mão esquerda”? Não, claro que não. Se fosse, todo cristão era seguidor desse caminho – afinal de contas, adoram um deus morto e comem carne humana todo domingo. Próximo.
Goetia é mão esquerda? Também não. É só um acordo de cavalheiros entre um humano e um não-humano. Não precisa ser do mal, não precisa ser individualista, não precisa ser uma busca de desejos de baixo nível. Às vezes a “conversa” pode não ser tão amigável, é verdade, mas as relações humanas não são assim também? E tem o agravante de que as coisas podem dar errado, se o praticante não souber o que está fazendo. Nessa hora, salve-se quem puder. E aposto que os malvadinhos arquetípicos não têm ideia do que fazer nesses casos. Mas aí é problema deles. Próximo.
E a tal Árvore da Morte, ou Árvore do Conhecimento? Para mim, essa expressão é ainda pior do que Caminho da Mão Esquerda, pelo simples fato de que não tem origem histórica alguma. Normalmente quem usa uma dessas expressões errado vai usar a outra também. Mas de volta à vaca fria. O cidadão que quer estudar e explorar o Sitra Achra e as Qliphoth, em vez da Árvore da Vida e as Sephiroth – será que ele está fazendo alguma coisa diferente? Mais uma vez, entrego a palavra a quem entende:
As Qliphoth recebem corretamente o nome de Sephiroth malignas e adversas, porque não são os princípios ou fatores independentes no esquema cósmico, e sim o aspecto desequilibrado e destrutivo das próprias Estações Sagradas. Não existem, na verdade, duas Árvores, mas apenas uma, e uma Qliphah é o reverso de uma moeda cujo lado oposto é uma Sephirah. Todo aquele que utiliza a Árvore como um sistema mágico deve necessariamente conhecer as Esferas da Qliphoth, porque ele não tem outra opção senão enfrentá-las.
Dion Fortune – A Cabala Mística, p. 247
Viu só? Eu não estou maluco. Dion Fortune sabia das coisas. Resumindo, não dá para seguir um caminho sem passar pelo outro, sem conhecer seu oposto. Pelo menos não se você estiver fazendo isso a sério.
Falando em sério, deixa eu falar uma coisa muito séria: fora a divisão dos Tantras, que já falei lá em cima, não existe esse negócio de mão esquerda e mão direita. Nenhuma tradição é assim ou assado, frito ou cozido. É tudo a mesma coisa, no fim das contas.
Eu juro que da próxima vez que um desses moleques vier me dizer, todo serelepe, que segue o caminho da mão esquerda, eu vou perguntar o que isso significa. Se gaguejar para responder, vai tomar bengalada na cabeça. De canhota. E tenho dito.
O Caminho da Mão Esquerda, no sentido tântrico original, é explorado em detalhes em Aleister Crowley e o Deus Oculto, de Kenneth Grant. A Cabala Mística, o clássico de Dion Fortune, é referência para entender a Árvore da Vida – e também o seu “lado negro”. Os dois estão disponíveis na loja da Penumbra Livros.
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